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Toni Negri: O que se Esconde por Trás da Crise Italiana?

O pensador e militante revolucionário Toni Negri analisa a grave crise italiana, antevendo o impasse pós-eleitoral atual, o qual põe em xeque não só a União Europeia como joga querosene crise política global.

Entrevista de Toni Negri para Francesco Oggiano para a Vanity Fair italiana  (Tradução Hugo Albuquerque)

Nota de Tradução — Pouco antes das eleições italianas de 4 de março último, Toni Negri, autor de Marx além de Marx, Verdades Nômades e personagem central de Negri no Trópico, todos publicados pela Autonomia Literária (o segundo publicado em parceria com a Editora Politéia e o último com a N-1 e a Editora da Escola da Cidade) , falou para a edição italiana da Vanity Fair sobre o quadro político de seu país natal: muitas das suas previsões se realizaram, como se pode ver pela grande votação da legenda de extrema-direita Lega Nord ou do confuso Movimento 5 Estrelas — e o consequente impasse na formação de governo — e, ainda por cima, dos riscos da Itália sair da Zona do Euro de forma totalmente desorganizada. O rápido bate-bola de Negri nos ajuda a entender um pouco as causas dessa crise, o que tem graves repercussões para a Europa e o Mundo.

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Eu espero que Bruxelas tome as rédeas da Itália depois de 4 de março. Não o desejo, uma vez que a burocracia europeia é um o grande inimigo. No entanto, é melhor ter qualquer coisa do que uma nulidade completa. Que venha Angela Merkel. Toni Negri tem a ideia clara sobre aquilo que se avizinha depois das eleições italianas. O ativista e filósofo de oitenta e quatro anos fala direto de Paris, cidade na qual viveu grande parte de sua vida, primeiro como refugiado, depois como Professor. Lá escreveu sua autobiografia, Galera ed esilio (NT — algo como Prisão e Exílio, ainda sem tradução para o português), na qual reconta os momentos marcantes de sua vida: a fundação do Poder Operário, a aventura da Autonomia Operária, os quatro anos passados na prisão política de Rebibbia, o processo por insurreição armada, a condenação por associação subversiva e de ser “mandante moral” de crimes políticos, a saída do cárcere depois da eleições pelos Radicais, os anos na França. Agora, no entanto, o teórico da esquerda radical italiana pensa que a esquerda italiana não existe mais: Está pulverizada. Não conseguiu inventar o futuro. Massacrou todos aqueles que poderiam lhe dar uma direção.

A quem se refere?

A nós, à esquerda dos anos 70.

Em que você votaria?

Em ninguém, me dá nojo votar nesse sistema partidário. Espero que um Gentiloni ou um Padoan [NT — Paolo Gentilioni e Pier Carlo Padoan, respectivamente ministro das relações exteriores e das finanças do governo anterior, ambos ligados ao Partido Democrático, os quais só assumiriam se novamente não houvesse uma regular formação de governo pela via técnica] de plantão levem o governo. Caso contrário, o euro italiano também acaba.

As últimas pesquisas indicam que os jovens estão cada vez mais distantes das urnas.

Vivemos em um torpor político. Mas, atenção: é equivocado crer que não haverá um despertar barulhento.

Um despertar barulhento…

Haverá um surto de felicidade, de ruptura, como aconteceu em 1968. Há cada dez testemunhamos esses despertares: Em 2000, com o movimento antiglobalista, em 2011 com aquele do Occupy. Daqui a pouco quem sabe. O problema é a organização.

Na Itália de hoje existe o Movimento 5 Estrelas.

Mas do que estamos falando? O 5 Estrelas são pulgas, são piolhos.

Você não reconhece nele as características do ativismo de base que abraçou há cinquenta anos?

Não, você consegue imaginar eles conduzindo uma greve selvagem numa fábrica ou a expropriação de um supermercado?

Bom, por sorte eles permanecem no terreno da legalidade.

Mas um movimento de verdade vai para a além das leis vigentes, do direito posto, ele constrói novas leis. É sempre uma busca de expansão do Legal, do Direito.

A proposta do 5 Estrelas de renda de cidadania lhe agrada?

É uma farsa. Aquilo que nós propúnhamos era universal. Era garantido a todos, aos ricos e aos pobres, aos trabalhadores e aos desocupados. Era verdadeiramente um renda que se adquiria com o nascimento, benefício do trabalho comum. Aquilo que eles propõe é só um subsídio para os pobres, semelhante aos oitenta euros de Renzi.

Renzi está na liderança do Partido Democrático agora..

Quem? O marido de [Maria Elena] Boschi [NT — líder do 5 Estrelas, com quem Renzi tenta fechar acordo para formar governo a qualquer custo]?

Ele é atacado à esquerda pelo ex-comunista Massimo D’Alema…

Quem? Aquele da Guerra do Kosovo?

e ao centro por Di Maio.

Que transparência…

Resta Berlusconi.

Um verdadeiro brincalhão.

Soa quase simpático.

Ele não. Mas me desagrada o exagero com o qual está sendo tratado. Não estou falando de sua inocência ou culpa. Eu digo que ele está sendo atormentado para além das razões legais, é equivocado.

E Berlusconi está atormentado?

Bem, ele foi julgado culpado antes pela imprensa e pelos adversários políticos do que pelos juízes.

Como torcedor fanático do Milan, você esperava vê-lo abandonar os rubro-negros?

Não. Esperava que ao menos com o Milan ele não se comportasse dentro desse padrão canalha. Mas ao contrário do que eu supunha, depois que ele perdeu o interesse político em fazer o time vencer, não investe mais um centavo. Agora nos resta esperar pelos chineses.

O treinador Gattuso lhe agrada?

Ele é um jogador e um treinador operário. E a mim os operários agradam sempre.

 

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