Foram uns dois minutos de silêncio, antes que Amarildo pedisse licença para colocar os pés na mesa.
-Posso lhes mostrar? O senhor me permite?
E como anui com um balançar de cabeça, ele trouxe o seu mais contundente argumento à mostra.
Ao vê-lo, o promotor colocou a mão na cabeça e disse que estava satisfeito. Já avisou que pedia absolvição e gentilmente fez um sinal para a escrevente, que significava que um estagiário iria lhe trazer a manifestação. Levantou-se e saiu da sala.
Eu fiquei impactado com aquela cena de Amarildo, algemado, em um esforço desesperado para jogar seus pés sem dedos para cima, em busca da salvação. Imediatamente me lembrei de Bruno, com seu único braço preso à cadeira como um símbolo de autoridade.
O sistema penal não era apenas uma máquina de moer gente. Ele tratava ainda pior os que por ventura já viessem fraturados.
OS ÚLTIMOS RÉUS é a continuação das crônicas do crime, iniciadas com a publicação de ENTRE SALAS E CELAS, pela Autonomia Literária. São relatos pungentes, ora agressivos, ora peculiares, dos habitantes das audiências criminais, seus dramas e esperanças, seus temores e alívios, suas angústias e arrependimentos. Uma mescla de sentimentos sensivelmente retratados por quem tinha a aflitiva tarefa de julgá-los.
“Só um autor, profundamente comprometido com os valores da humanidade que nos constituem, poderia ter transformado a realidade da aridez da justiça criminal, em histórias tão tocantes e transformadoras. Só um magistrado, dedicado à efetividade das garantias e direitos civilizatórios, observador dos pequenos avanços e dos grandes retrocessos, só um crítico ao sistema contaminado pela falácia da segurança, e pelo desejo de vingança, só um escritor angustiado com o papel que representa, e com as expectativas que nunca se cumprem com condenações e encarceramentos, poderia criar, pela sucessão de crônicas aparentemente desordenadas, o olhar curioso e empático que a obra suscita.”
– Andrea Pachá
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